terça-feira, 19 de outubro de 2010

O fogão a lenha
Soltava línguas de fogo
A fumaça embrutecia
Paredes e telhas
Minha avó ao meu lado
Contava-me causos
Lá fora a chuva caia
Insistentemente.
Minhas irmãs, primas e primos, eram repelidos
Pelas palavras da vó:
— Todo mundo pra cama, joguem um cobertor na televisão, vamos rezar...
O fogo, agora, resumia-se em brasas.
Enquanto minha imaginação fluía juntamente às águas da enxurrada.

sábado, 4 de setembro de 2010

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Pensamentos

Num frágil e desbotado varal
Estendo pensamentos
Não os recolho.
Todos sofrem
As influências das intempéries.

Escrever

Forte
Sobressalto
Inesperado.
A mão faz um movimento
Brusco.
Risco no papel.
Como se o mundo, acelerando-se deslizasse
Entremeio à tinta da esferográfica.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Afinal de contas, o que é o homem diante da natureza?

A primeira coisa que se destaca no homem ao contemplar-se a si próprio, é seu corpo, isto é, certa parcela de matéria que lhe é subjetiva. Mas, para compreender o que ela representa a que fixá-la em seus determinados limites, intentar compará-la a tudo o que se encontra acima ou abaixo dela. — Mire e veja, não se atenha, atente em olhar para os objetos que o cercam, simplesmente, mas contemple a natureza inteira na sua plenitude. Considere esta brilhante luz colocada acima do homem, como uma lâmpada eterna para iluminar o universo, e que a Terra lhe espelhe como um ponto na órbita ampla do cosmo e maravilhe-se de ver que essa amplitude não passa de um ponto insignificante na rota dos outros astros que se espalham pelo espaço. E se ao fitar, nossa vista se deter, ainda que nossa imaginação não pare; mais rapidamente ela se cansará de revelar, que a natureza de fecundar. Todo esse mundo visível é apenas uma quimera perceptível em relação à maravilha da natureza, que nem sequer nos é dada a conhecer de um modo vago. Por mais que ampliemos nossos questionamentos para além da imaginação, pelo cosmo, conceberemos tão somente átomos em comparação à realidade das coisas. Esta é uma esfera cujo centro se acha em toda parte e cuja circunferência não se encontra em nenhuma. E o fato de nossa imaginação perder-se neste pensamento constitui, em suma, a maior manifestação da onipotência de Deus. Que o homem, voltado para si próprio, considere o que ele é diante do que existe; que não perca passo, e se descubra como uma partícula ilhada neste planeta, e que da pequena cela onde se encontrar encarcerado, do universo, aprenda a avaliar em seu valor exato a terra, os reinos, as cidades e a ele próprio.

Canção

Ando à procura de espaço
para o desenho da vida.
em números me embaraço
e perco sempre a medida.
se penso encontrar saída,
em vez de abrir um compasso,
projeto-me num abraço
e gero uma despedida.
se volto sobre o meu passo,
é já distância perdida.
meu coração, coisa de aço,
começo a achar cansaço
esta procura de espaço
para o desenho da vida.
já por exausta e descrida
não me animo a um breve traço:
- saudosa do que não faço,
- do que faço, arrependida.
( Cecília Mireles - 1901-1964 )

A-boi-o

O vaqueiro tange.
O carro de boi range.
Aboio!

Um fio d'água
corta a veia
das veredas, verdinhas, verdinhadas.

O vento toca
O buritizeiro.

Quando chega chuva,
A paisagem do sertão muda
-Eh. boooooi.